quarta-feira, 23 de setembro de 2009

A DEMOCRACIA CONTRA O ABSOLUTISMO POPULISTA

A tentativa levada a efeito por Hugo Chávez, Lula e Daniel Ortega de reinstalar, à força, Manuel Zelaya no poder, em Honduras, obedece a uma espécie de diretriz das esquerdas latino-americanas: evidenciar que os Poderes Legislativo e Judiciário nada podem contra um “presidente eleito pelo povo”, pouco importa o que ele faça e como se comporte. As urnas confeririam ao eleito uma autoridade que estaria acima da própria Constituição. Assim se deram as “mudanças” na Venezuela, na Bolívia e no Equador. O primeiro país já é uma ditadura; os dois outros estão a caminho, seguidos de perto por Nicarágua. Não pensem que Lula é estranho a este sentimento. É que, no Brasil, as coisas têm de ser feitas de outro modo. O fato é que estamos, no continente, diante de uma óbvia hipertrofia do Poder Executivo, que passa a reivindicar o poder absoluto ancorado na “legitimidade popular”. A fórmula, assim, fica simples: “Zelaya foi eleito? Então tem de governar”, pouco importa se de acordo com a Constituição ou contra ela.

Por isso a conspirata de agora contra o governo hondurenho. A verdade cristalina, evidente, comprovada pelos fatos, é que Honduras, apesar de todas as dificuldades enfrentadas pelo estúpido isolamento a que vem sendo submetida depois da deposição constitucional de Manuel Zelaya, estava vivendo relativamente em paz. E o advérbio fica por conta das naturais dificuldades que enfrenta um país nessas condições. Justiça, Congresso, imprensa, Igreja, sindicatos… Cada instituição ou ente da República vivia na plenitude de seus direitos. Era assim até que Lula irrompesse no cenário.

Não custa lembrar: Zelaya foi deposto PARA QUE A LEI SE CUMPRISSE. Como sabem os leitores deste blog, não preciso de pelo menos 24 horas para opinar sobre alguma coisa; não espero que os leitores primeiro se manifestem para depois dizer o que penso. Outros aproveitam um detalhezinho ou outro para dar cavalo de pau no que vinham afirmando e sustentar, então, o contrário. No dia do que chamam golpe, que golpe nunca foi, escrevi aqui o texto Quem é mesmo o golpista em Honduras? POR ENQUANTO, Forças Armadas garantem Constituição democrática. Fui o primeiro, talvez na imprensa mundial (estou parecendo o Lula, rá, rá, rá), a fazer o óbvio: ler a Constituição hondurenha, que vinha garantindo três décadas de regime democrático no país. Não fiz nenhum favor a ninguém. Era uma obrigação de todo jornalista. Alguns não a cumpriram até hoje.

Ocorre que Hugo Chávez anunciou o que chamou de “golpe”, o Brasil seguiu atrás como cachorro vagabundo atrás do caminhão de gás, e José Miguel Insulza, o asqueroso socialista chileno que preside a OEA, estrilou e anteviu guerra civil… Aí veio o governo de Barack Hussein, que terceirizou para Madame Clinton o “setor América Latina”. E a imprensa mundial, incluindo a brasileira, que chega a estar infiltrada pela assessoria de imprensa de Celso Amorim, saiu, bovinamente, a protestar contra o “golpe”.

Que golpe? A Constituição evidencia que Zelaya caiu para preservar as instituições. Ele estava fazendo um plebiscito declarado ilegal pela Justiça e rejeitado pelo Congresso. Deu ordens ao Exército que contrariavam a Constituição. Foi deposto pela Justiça. Mas um erro grave foi cometido: foi retirado do país. Conta-me uma fonte ligada ao governo hondurenho que os representantes da Justiça e do Congresso que negociaram com Zelaya caíram num truque infantil. A decisão inicial, com base na Constituição e nas leis, era prendê-lo e processá-lo. Ele teria pedido para sair. Convenceu os interlocutores que isso evitaria confrontos e eventuais mortes. Cederam a seus apelos. O pijama já fazia parte de sua pantomima. Chávez, o real organizador e financiador do plebiscito, tratou de cada detalhe da saída de Zelaya e, depois, da “resistência”. O governo provisório de Honduras apostou que o madeireiro milionário pensaria nos próprios negócios e na fortuna que tem no país e não criaria problemas. Deu no que deu.

A fonte é muito boa, o que não significa que acredite sem reservas na história. O comandante do Exército já havia dito a Zelaya que não cumpriria uma ordem declarada ilegal pela Justiça. Ele sabia que iria ser deposto. Não queria ser preso. E não foi. Retirá-lo do país, à força ou numa negociação, foi um erro estúpido. Conferiu ares de verdade à mentira evidente de que teria havido um golpe. Sigamos.

Honduras vivia, então, relativamente em paz. Cedo ou tarde, o governo que saísse das urnas acabaria sendo reconhecido. MAS UMA NOVIDADE INSUPORTÁVEL ESTARIA DADA PARA OS BOLIVARIANOS E SEUS AMIGOS: PRESIDENTE QUE RECORRER ÀS ELEIÇÕES PARA AFRONTAR A CONSTITUIÇÃO CAI. E é derrubado democraticamente. O próprio Lula, pesquisem, chegou a comentar: “Se isso vira moda…” Pois é, se isso “vira moda”, o bolivarianismo vai para o vinagre. HONDURAS, COM EFEITO, É UM PÁIS PEQUENO DEMAIS PARA INCOMODAR TANTO. A QUESTÃO É DE PRINCÍPIO PARA OS AUTORITÁRIOS. Eles precisam da soberania absoluta - e absolutista - das urnas para levar adiante o seu projeto de ditadura.

Assim, Lula, Ortega e Chávez se articularam para instaurar em Honduras o caos, a desordem, o clima de guerra civil. E pouco se importaram ou se importam com o destino dos hondurenhos. A sorte do governo provisório - e da população - é que Zelaya tem o apoio de uma minoria que chega a ser ridícula. Por isso, os distúrbios de rua são contidos com relativa facilidade. Chávez estava e está determinado a provocar um banho de sangue no país, como ficou evidente nas duas outras vezes em Zelaya tentou voltar Na semana seguinte ao conflito, esquerdistas da Venezuela e da Nicarágua foram presos no país. Estavam lá com o único fito de participar das manifestações.

O que está em jogo em Honduras é mais do que reinstalar ou não Zelaya no poder. O que está em jogo é saber qual é o limite da dita soberania de um governo eleito pelo povo. Será ele tão poderoso que pode afrontar a própria Constituição que dá legitimidade à escolha democrática? Ora, para um democrata, a resposta óbvia é “Não”. O povo não é soberano para rasgar a Constituição que declara a sua soberania, entenderam? E isso significa que há regras. As da Constituição hondurenha foram violadas por Zelaya.

Trata-se, em suma, de um choque entre a legalidade democrática e, se me permitem, o populismo absolutista. Houvesse um governo nos EUA e não um garoto-propaganda das ONGs, que tem a ambição de governar o país a partir da TV e da Internet, isso já teria ficado claro há tempos. E esses ratos gordos não estariam tão assanhados. O problema é que o gato está cuidando da maquiagem para mais um espetáculo, mais uma entrevista, mais um show midiático.
Por Reinaldo Azevedo

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